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domingo, 5 de julho de 2015

O Amor no Colo

Fabrício Carpinejar

A dor não pede compreensão, pede respeito. Não abandonar a cadeira, ficar sentado na posição em que ela é mais aguda.

Vejo homens que não têm coragem de terminar o relacionamento. Que não esclarecem que acabou. Que deixam que os outros entendam o que desejam entender. Que preferem fugir do barraco e do abraço esmurrado. Saem de mansinho, explicando que é melhor assim: não falar nada, não explicar, acontece com todo mundo.

Encostam a porta de sua casa (não trancam) e partem para outra vida.

Não é melhor assim. Não tem como abafar os ruídos do choro. O corpo não é um travesseiro. Seca com os soluços.

Não é melhor assim. Haverá gritos, disputa, danos. É como beber um remédio, sem empurrar a colher para longe ou moldar cara feia. É engolir o gosto ruim da boca, agüentar o desgosto da falta do beijo.

Será idiota recitar Vinicius de Moraes: “que seja infinito enquanto dure”. A despedida não é lugar para poesia.

Haverá uma estranha compaixão pelo passado, a língua recolhendo as lágrimas, o rosto pelo avesso. Haverá sua mulher batendo em seu peito, perguntando: “Por que fez isso comigo?”

Haverá a indignação como última esperança.

Haverá a hesitação entre consolar e brigar, entre devolver o corte e amparar.

Vejo homens que somente encontram força para seduzir uma mulher, não para se distanciar dela.

Para iniciar uma história, não têm medo, não têm receio de falar.

Para encerrar, são evasivos, oblíquos, falsos. Mandam mensageiros.

Não recolhem seus pertences na hora. Voltarão um novo dia para buscar suas coisas.

Não toleram resolver o desespero e datar as lembranças. Guardam a risada histérica para o domingo longe dali.

Mas estar ali é o que o homem precisa. Não virar as costas. Fechar uma história é manter a dignidade de um rosto levantado, ouvindo o que não se quer escutar. Espantado com o que se tornou para aquela mulher que amava. Porque aquilo que ela diz também é verdade. Mesmo que seja desonesto.

Desgraçadamente, há mais desertores do que homens no mundo.

Deveriam olhar fora de si. Observar, por exemplo, a dor de uma mãe que perde seu filho no parto.

O médico colocará o filho morto no colo materno. É cruel e – ao mesmo tempo – necessário. Para que compreenda que ele morreu. Para que ela o veja e desista de procurá-lo. Para que ela perceba que os nove meses não foram invenção, que a gestação não foi loucura. Que o pequeno realmente existiu, que as contrações realmente existiram, que ela tentou trazê-lo à tona. Que possa se afastar da promessa de uma vida, imaginar seu cheiro e batizar seu rosto por um instante.

Descobrir a insuportável e delicada memória que teve um fim, não um final feliz. Ainda que a dor arrebente, ainda é melhor assim.


quarta-feira, 1 de julho de 2015

Partidas

O jovem cantor sertanejo comoveu milhões com sua morte prematura, causada por um acidente de carro. Mas hoje relato a perda de uma jovem que, simplesmente, "adormeceu" no último fim de semana.

É sempre estranho ver gente jovem demais, alegre demais, boa demais morrer. Como se a morte precisasse de desculpas ou critérios para fazer valer.

Por que não nos acostumamos com isso?

Taí uma coisa pra qual nem sempre somos preparados. Morrer, diferente do nascer, não tem gestação. Diferente da vida, ela não precisa de nada para acontecer.

Enquanto não sabemos lidar, aceitar ou entender que a morte faz parte da vida, que possamos ao menos ser reconfortados pela lembrança e os bons momentos.

Surpreende ver vidas que se vão no auge, no ápice. Mas talvez seja melhor despedir-se estando pleno. "Morrer estando vivo!", como li certa vez. 

Vibrações - Ela Partiu

Confiança é Respeito

Sobre relacionamentos a distância? Confiança!

Mas você não sabe se a outra pessoa está te traindo! O importante é  que não estou enganando, ou sacaneando o outro. 

Ouvi, certa vez, em uma palestra espírita, que em um relacionamento não é o que o outro faz que importa, mas sim o que eu faço. 

Não podemos ter controle sobre as atitudes do outro, só podemos controlar aquilo que fazemos. É com isso que devemos nos preocupar. Respondemos pelos nosso atos, cada um responde pelos seus atos. 

Se a certeza do erro do outro (mentira, traição e etc) não justifica que eu também cometa erros, não será a incerteza que legitimará. 

Permanecer ou não na relação é outro questionamento. Mas a maneira correta de se agir (longe ou perto) é inquestionável: confiança e/é respeito.
Nenhum de Nós - Confiança

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Difícil fotografar o silêncio

(Manoel de Barros)

Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada, a minha aldeia estava morta.
Não se via ou ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas. Eu estava saindo de uma festa.
Eram quase quatro da manhã. Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado. Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.

Preparei minha máquina de novo.

Tinha um perfume de jasmim no beiral do sobrado.
Fotografei o perfume. Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.

Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão.
Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa. Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre. Por fim eu enxerguei a nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakoviski -- seu criador.
Fotografei a nuvem de calça e o poeta. Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.


Antônio Abujamra - Difícil Fotografar o Silêncio

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

A arte do desapego

por Nara Rúbia Ribeiro

Muitos vivenciam o amor como um rasgo a que a alma se submete intencionalmente para exigir que a mão do amado a costure. O problema é que a mão do outro nem sempre está disponível para esse trabalho: a alma sangra, dói, e os rasgos se expandem… A dor, quando bem resolvida, pode ser um prenúncio de beleza. Mas, para que o belo de fato advenha, é preciso viver a dor, senti-la, tocá-la, integrar-se a ela, e transmutá-la, sabedores de que o vivenciar a dor também é parte do exercício de amor.

Já tive muitos castelos desmoronados na poeira dos dias. Quem não os teve? E a dor, nesse caso, é inevitável. Em nossa alma aprendiz, amar é desejar estar ao lado do outro, dentro do outro. É querer ser o outro sem sair de si mesmo. É construir uma redoma de sonho e ali inserir o amado, sob a eterna e vigilante proteção dos nossos olhos. E queremos que o outro caiba exatamente no nosso sonho e viva o nosso projeto de existência. Que ele esteja no cenário que construímos e encene o papel que lhe escrevemos.

E, num repente, algum novo vento nos sopra e mostra que o outro não é exatamente o aquele a quem julgamos amar. Percebemos que ele tem segredos e mistérios maiores que pensávamos e ficamos perplexos ao perceber que ele tem caminhos traçados e que quer percorrê-los, muitas vezes, sem nós. Perdemos a voz ao saber que a alma do outro é hóspede e hospedeira de outras almas. E as nossas pernas tremem ao constatar que a redoma era ilusão. Que todo o castelo de amor era ilusório. E a dor chega e castiga e fustiga a alma com cem mil acusações.

O que nos sangra, num momento como esse, é a obrigação de desamar. Mas será que isso existe? Os poetas, há muito, já apregoaram que o amor é sempre “para sempre”. Questionaremos as verdades poéticas? Banalizaremos o amor? Faremos dele um bibelô barato e quebrável destinado a adornar, por breves dias, as estantes da nossa alma?

Ocorre que somos ainda aprendizes da arte do eterno. O amor não reside senão no desejo da plenitude do outro. Ele não se esmera a não ser no respeito ao outro. Ele não pulsa a não ser para o querer o bem e sonha que o outro, pássaro livre em perfeição de voo, possa vislumbrar, dos cumes de si mesmo, os mais belos sentimentos e paisagens da terra.

E assim, quando o outro não mais deseja estar ao nosso lado, isso nos fere e sangra, mas o que nos massacra não é o outro. É desejo egoístico de aprisionar um espírito que também, assim como nós, tem sede de infinitos.

Tenho comigo que o que mais dói é a obrigatoriedade que nos impomos, quando o castelo desmorona, de desamar o outro. E embora talvez não o tenhamos amado de fato, fizemos um esboço de amor e é desorientador apagá-lo. Desamar é doloroso demais, porque o desfazimento do amor é contrário à nossa natureza etérea, espiritual, eterna.

Devemos, sim, exercitar o desapego; não o desamor. Desejar a liberdade, a integralidade, a plenitude do outro. Compreender que o que dói não é o amor não correspondido, mas a quebra das correntes (talvez até de ouro) com que tentávamos prender alguém. Apenas quando soubermos apreciar com encantamento a liberdade, seja ela nossa ou de um ser amado, teremos conhecido a face invisível e invencível de um amor verdadeiro.

E a alma, outrora rasgada, fará das cicatrizes uma arte emoldurada e rebordada de vida, na certeza de que toda a dor, bem lá no fundo, labora a nosso favor.

Goiânia, 01 de fevereiro e 2015. 

Marisa Monte - A Sua 

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Em algum lugar por aí, tem alguém pensando em você com ternura


POR ANDRÉ J. GOMES

Retirado do site: http://www.revistabula.com 


Repare. Em algum lugar, de alguma sorte, alguém está fazendo uma coisa boa por nós. Talvez você nem note. Mas tem alguém compensando nossa truculência, atenuando a dureza do mundo, nivelando a vida por cima. Tem alguém levando à frente a compaixão divina num gesto de bondade simples, à toa. Alguém de coração disposto e mãos ativas. Tem, sim. Em algum lugar por aí, tem alguém pensando em você com ternura.


De repente, vem um sentimento breve de calma. Um silêncio bom entre tanto grito, um remanso imprevisto no corre-corre, estio na tempestade, trégua na guerra. Sensação inesperada e inexplicável de que tudo vai dar certo. Não é nada, não. É só alguém, em algum canto, fazendo algo bonito por nós.

A avó que recorda com grande saudade quando éramos pequenos. Os pais que falam de nós com carinho até aos desconhecidos. Os velhos professores que nos comparam em silêncio a seus alunos de hoje, quase dizendo “ahh… como fulano era bom” ou “no tempo do sicrano era outra coisa”.

O amigo distante que assiste a um filme antigo e nos relembra em dolorida mudez, machucado de lembranças do tempo em que éramos novos e próximos, um sorriso imenso nos olhos de choro. As almas boas que nos bendizem pelas costas. As criaturas justas que nos dão sua palavra e cumprem o que prometem, os cães e os gatos que nos oferecem a barriga em festa. Aquela gente que nos ama sem mais o quê.

Quando alguém nos faz uma coisa bela, o mundo entra nos eixos. Temos todos o direito a receber afagos e o dever de redistribuí-los. De atravessar o mundo partilhando beleza e ofertando decência até chegar enfim aos braços que nos cabem e ao abraço em que cabemos.

A beleza é a matéria-prima de todo ofício honesto. É o que nos resta e o que nos sobra. Às cantoras e aos cantores, às atrizes e aos atores e artistas de todo gênero, alguém no escuro da plateia dispara seu aplauso comovido de fé e alegria sem ser visto, e comprova o quanto é bonito retribuir a quem nos dá seja lá o quê.

Aos operários e aos médicos, guardas noturnos e secretárias, pintores e cozinheiras, juízes e manobristas, marceneiros e esportistas e a toda gente sob o céu há de existir gratidão e conforto antes, durante e depois da lida.

Há de haver beleza em cada “obrigado”, “por favor”, “pois não” e outras gentilezas essenciais esperando quem os diga.

E quem os diz é alguém fazendo algo bonito pela mera volúpia bondosa de nos abrir os braços. Nos pontos de ônibus, no trânsito parado, nas salas de espera ou na solidão do quarto escuro, aguardamos todos quem nos faça uma coisa bela. E assim, na espera, compreendemos enfim nossa responsabilidade de fazer e espalhar beleza, nosso mais poderoso e sublime ofício nessa vida.




Paulinho Moska - Pensando em Você 

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Preto Consciente

Ter raízes mineiras, goianas, matogrossenses e potiguares me pluralizou. Mesclou e abrasileirou minha cara lerda, meu nariz semi-largo, meu cabelo cacheado, minha barba fechada, minha falta de tamanho, ou mesmo meu sangue grosso.

Mas ainda com tanta mistura me declaro negro. Sim, minhas raízes são negras. Também possuo brancas e indígenas, mas a influência afro pesou na mistura. Uns me definem como moreno, mas sei bem o que vejo além do reflexo no espelho e por vezes nos olhares mais temerosos.

Que um dia esse feriado seja abolido. Não numa assinatura mal-feita, como foi com a escravidão. Mas em definitivo, sem rastros de sangue, intolerância e discriminação. Que todos possam se olhar no espelho e  perceber a cota negra em suas veias.

Sinto-me consciente de quem sou. Um preto consciente da sua história familiar, social e cultural. Mas a grande verdade é que enquanto precisarmos nos definir em tudo, nada se resolverá.

Enquanto houver as separações haverá essa diferença boçal de gente que se acha ser superior. Aliás, esse discurso já promoveu e ainda promove guerras.

Hoje eu queria apenas lembrar que numa sociedade tão mista e ao mesmo tempo tão intolerante e preconceituosa quanto a nossa sempre é dia para se ter consciência, negros, índios, pardos, amarelos, vermelhos e brancos!

Criolo - Sucrilhos 

domingo, 9 de novembro de 2014

A Extinção do Mal

Era cinco e pouco da manhã quando acordei assustado com a claridade. Desacostumei com esse dia que começa cedo demais longe do planalto central.

Uma conferida no relógio fez tudo se acalmar. Mas com o sono perdido a solução foi ler meu livro de mensagens psicografadas por Chico Xavier. Na publicação apenas mensagens atribuídas à Bezerra de Menezes e Meimei.

O texto, escolhido aleatoriamente, trouxe a forte e bela mensagem de Bezerra e a reflexão para vários momentos da vida. Reforçando e apoiando a conduta de evitar o embate, certos desgastes e o exercício da paciência e da tolerância (nem sempre fácil e nem sempre conseguido).

Mas, não por acaso, a mensagem chega em momento oportuno para todos nós que  almejamos um mundo melhor. Seja no universo ao nosso redor, ou naquele pequeno infinito que existe dentro de cada um.


Extinção do mal

Na didática de Deus, o mal não é recebido com a ênfase que caracteriza muita gente na Terra, quando se propõe a combatê-lo.

Por isso, a condenação não entra em linha de conta nas manifestações da Misericórdia Divina.
Nada de anátemas, gritos, baldões ou pragas.

A Lei de Deus determina, em qualquer parte, seja o mal destruído não pela violência, mas pela força pacífica e edificante do bem.

A propósito, meditemos.
O Senhor corrige:
a ignorância: com a instrução;
o ódio: com o amor;
a necessidade: com o socorro;
o desequilíbrio: com o reajuste;
a ferida: com o bálsamo;
a dor: com o sedativo;
a doença: com o remédio;
a sombra: com a luz;
a fome: com o alimento;
o fogo: com a água;
a ofensa: com o perdão;
o desânimo: com a esperança;
a maldição: com a benção.

Somente nós, as criaturas humanas, por vezes, acreditamos que um golpe seja capaz de sanar outro golpe.
Simples ilusão.

O mal não suprime o mal.

Em razão disso, Jesus nos recomenda amar os inimigos e nos adverte de que a única energia suscetível de remover o mal e extingui-lo é e será sempre a força suprema do bem.

Bezerra de Menezes, psicografado por Chico Xavier

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Eu, você e a paz

Há tempos não ia ao congresso. Hoje "madruguei" (exagerando quanto a isso) pra participar da homenagem da câmara dos deputados ao iluminado Divaldo Franco e seu Movimento Você e a Paz.

Com uma vida inteira de ajuda e doação ao próximo, Divaldo é um dos nossos grandes exemplos dentro do cristianismo. Antes de ser um espírita, ele é um grande espírito cristão que praticou e pratica a ajuda aos mais necessitados, seguindo o exemplo do Cristo.

Assim como Chico Xavier, um homem do nosso tempo que não se cansa de ajudar e levar palavras de conforto, amor e paz aonde vai. Trabalho virtuoso, reconhecido e premiado pela ONU.

Hoje vi o plenário cheio, com todos atentos às homenagens, felizes pelo reconhecimento de Divaldo como um promotor da paz e apoiando o movimento ecumênico proposto por ele (principalmente em tempos de intolerância e tanta confusão gerada pelas eleições).

Como bem disse Divaldo, durante seu discurso no plenário, "O medo deu lugar a ira. Um resultado natural do ataque. A ira, fenômeno psicológico, que abre lugar ao ódio, rancor, insegurança, ciúmes... e o amor vem como solução. O amor é a alma da vida".

Com exceção de alguns, muitos, deputados que apenas confirmaram sua presença na sessão e saíram do plenário ignorando a homenagem ao simpático médium baiano. Mas para cada parlamentar que o ignorou havia uma dezena de pessoas que foram ali ouvir e também reforçar a importância dele que se intitulou como um ser humilde e que "o espiritismo seria o merecedor daqueldaquelas homenagens".

Também foram lembrados durante o evento o trabalho da Dra. Zilda Arns e de Chico Xavier. Dois importantes emissários da paz e do combate a desigualdade social. Uma bela e devida homenagem a essas três importantes personalidades da nossa história social/religiosa.

Que a paz seja um compromisso de todos. Cada um a promovendo como pode, mas sem deixar de contribuir para a melhora do nosso planeta. Que Zilda, Chico e Divaldo sejam nossos exemplos.


sábado, 4 de outubro de 2014

Intolerância Eleitoral



Desde o início do período eleitoral me mantive quieto quanto a intenção de voto ou a defesa desse, ou daquele candidato nas minhas redes sociais. Ainda me manterei sigiloso quanto ao meu voto, mas me manifesto contrário as declarações do presidenciável Levy Fidelix.

Democracia não dá o direito de ofender ou discriminar quem quer que seja. A democracia tem, entre outras premissas, a liberdade de expressão, sim! (entendendo que a liberdade de expressão não é ofensa e discriminação) Bem como a democracia preza pela igualdade nos direitos.

Um candidato à presidência não poderá, jamais, defender suas opiniões religiosas, acima da garantia igualitária de direitos para todos os cidadãos. Independente de opção/escolha afetiva e sexual, classe social e etnia.

Por isso é sempre importante lembrar que um pastor não pode impor os dogmas do cristianismo a um país, bem como um rabino, um babalorixá, um padre ou qualquer outro líder religioso não poderá impor suas crenças, caso sejam eleitos enquanto políticos.

O presidente deve ser o primeiro a garantir direitos iguais a todos. Assim sendo, ele não pode impedir a garantia do direito ao casamento por pessoas do mesmo sexo. Ele não deve ofender pessoas por terem uma opção ideológica/religiosa/cultural/musical/sexual... diferente da dele, especialmente por ser/querer o cargo máximo do Poder Executivo.

Os homoafetivos não são doentes para serem tratados "bem longe daqui" e a psicologia já afirmou que o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo não é uma doença, contrariando o presidenciável. A declaração de Levy ofende todos que lutam pela igualdade dos direitos, os homoafetivos, os simpatizantes e defensores da causa LGBT's e dissemina a intolerância e o ódio, ofendendo também quem luta por dias de mais amor, respeito e paz em nosso país.

Talvez ele não ofenda a 99,9% dos brasileiros como foi declarado, mas ofenda uma boa parte. A parte que busca por dias de mais respeito para com o próximo. A parcela que sabe que a igualdade dos direitos é o principal passo para um Brasil melhor.

Que essa eleição mostre a maturidade do eleitor brasileiro e que, principalmente, possamos afastar da liderança do nosso país aqueles que são intolerantes, preconceituosos, racistas e retrógrados que se valem da religião e da ignorância do eleitor para seu benefício político/financeiro.

Quando o "país do futuro" apresenta candidatos intolerantes e preconceituosos pode ser um sinal de que ainda estamos no passado.


Jorge Vercilo - Avesso

domingo, 17 de agosto de 2014

Os urubus logo sobrevoam a carniça

Pra muita gente é ridículo ver pessoas comovidas com a morte do candidato e ex-governador do Pernambuco, Eduardo Campos. Eu me abati. Eu me doí. Eu remoí meus fantasmas mais tenebrosos. A notícia me trouxe alguns nós, alguns entraves inexplicáveis e explicáveis.

Dos inexplicáveis, não posso falar muito. Daquilo que posso dizer, está a dor de reviver perdas inesperadas. O desequilíbrio, a falta de rumo, de prumo, de chão. A espera por uma notícia que desminta a tragédia. Achar que na manhã seguinte, quando se consegue dormir, se perceberá que tudo não passou de um pesadelo.

Esse atordoamento de ver gente jovem demais, feliz demais, boa demais ir cedo é, ironicamente, demais. Não que ele tivesse todas essas virtudes (talvez não tivesse nenhuma ou até mais, não sei), mas me aperta ver tanta gente indo embora com essa impressão de que não era a hora. 

Volto ao meu caso, minha vivência pessoal, para logo me colocar no lugar do outro. A família que perde seu eixo, seu prumo, sua sustentação e não sabe bem por onde recomeçar a juntar seus pedaços. Nesse caso, uma analogia aos destroços do avião, espalhados por dezenas de casas. Leva tempo pra se situar e tomar conhecimento do estrago.

Vi durante esses dias inúmeras piadas prontas sobre causas da morte relacionadas com possíveis atentados e mandandes. Mas isso é apenas a constatação de que tão logo a desgraça seja anunciada os urubus já sobrevoam. É esperado de gente medíocre o tripudio sob a dor alheia com a justificativa política, ou mesmo de que o brasileiro é "criativo". Uma pena tanta criatividade em prol da dor que nos é distante, mas que cedo ou tarde bate à porta de todos.

Quem já recebeu essa ingrata visita se comove. Comigo não foi diferente. Desde quarta uma sensação ruim, lembranças e mais lembranças. Na sexta eu senti, logo cedo, a presença forte da minha mãe e isso me fez não esperar muito do dia. Os detalhes da cozinha, a lembrança de segurar sua mão, alguma frase sempre repetida, o rádio, o som da rua, o relógio, o tempo... faz tempo, mas sempre parece que foi ontem. Acho que foi (outra vez) na quarta. 

Legião Urbana - Love In The Afternoon

domingo, 27 de julho de 2014

Remorsos

Desde a morte da minha mãe eu teimo em pensar que cada vez que escrevo/falo sobre o assunto já me basta para esgotá-lo. Tenho sempre a mesma impressão de que esvaziarei o que tanto me sufoca. O tema não se esgota. É recorrente nos textos e diariamente nas milhares de lembranças de sons, gostos, objetos, lembranças, piadas e, principalmente, naquilo que ela não está vivenciando.

De todos os parentes e amigos, eu acredito ser o que menos soube lidar com o fato. Nunca chorei tudo o que acredito ser o necessário para exorcizar muitos dos problemas surgidos com essa perda. Não bastando achar que foram poucas lágrimas, me questiono quanto minha atitude ser um demonstrativo de afeição. Minha cabeça quer medir amor conforme o sofrimento.

Vi  todos ao meu redor em prantos, mas eu não. Isso ainda me assusta, me corrói. Por quê e pra quê tanta coisa acumulada? Alguns me classificaram, na ocasião, como sendo muito forte. Só que esse "excesso de força", ainda hoje constante, têm causado cansaços, também constantes.

Não me privo de choros. Tenho até uma visão poética sobre eles, acho que são necessários quando os sentimentos estão excessivos. A válvula de escape. Só não sei "ativar" essa fonte. Buscar lembranças, cavá-las, para conseguir alguns tímidos choros têm sido o máximo alcançado.

Não bastando tudo o que já embola e bagunça a cabeça, sofro da síndrome de-uma-eterna-não-despedida. Em nosso último contato visual, saí me despedindo às pressas, correndo com minhas malas, voltei e nunca mais a vi. Fica sempre a pergunta de, por quê não me despedi como se fosse a última vez que nos veríamos? Porque antes das perdas sofremos de outra síndrome, a de-que-todos-que-amamos-não-morrem-de-repente. Uma ingênua descrença de que tudo pode acontecer, a qualquer momento, pro bem ou pro mal.

Sinto remorso, por uma não despedida. Por uma sensação de situação mal-resolvida. Penso em tantas coisas que poderiam ter sido ditas ou feitas. Penso que poderia ter havido um beijo, um abraço demorado, um gesto qualquer que selasse e marcasse como um adeus.

De tudo ficou o remorso eterno. A sensação de que, algumas vezes, voltarei pra casa e tudo estará como deixado. Existe uma descrença na situação, talvez por essa não-despedida. Mas qual preço pagaria por ter essa despedida? O mesmo que meu pai, irmão, tias pagaram ao vê-la morrer e tentarem desesperados "ressuscitá-la"?

Remorso, dúvida, incertezas... tudo se escrotizando, a cada dia, mais e mais aqui dentro. Mais uma semana começando, remoendo, revirando.

Simone e Zélia Duncan - Jura Secreta

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Sobre beijos e intolerância

Engraçado como um beijo causa tanto incômodo. Enquanto isso, cenas de violência, nudez e sexo passaram desapercebidas pela crítica do espectador de Em Família.

Desde sua estreia eu já vi: 
- uma personagem ser estuprada; 
- outro, espancado e (quase) enterrado vivo pelo galã da trama; 
- uma outra que humilha o pai, incentiva a filha a cair na putaria e passa o dia com um copo na mão;
- e por último, uma personagem que é suspeita de matar a empregada para ficar com a filha e agora descobriu que a criança é fruto de uma pulada de cerca do ex-marido (que ela largou pra ficar com o então pai da menina).

Com tantas polêmicas que me pareceram mais incômodas e absurdas, por quê o casamento (que igual a todos têm um beijo) é a cena mais "desnecessária" para ser exibida em horário nobre?

Há, nesse burburinho inconformado, que precisa de postagens irritadas nas redes sociais, justificativas cristãs por parte de alguns e argumentos intolerantes e exagerados de outros, todas as formas de preconceito possíveis.

Alguns comentários vêm até precedidos de um "não tenho nada contra...", ou "tenho até amigos que são..." para tentar amenizar, disfarçar, mas apenas escancarando e evidenciando, sem querer querendo, o preconceito em se assumir um preconceito.

Não tragam os trechos bíblicos como explicação, porque isso não serve de base para nenhum debate, ou de argumento para se justificar algo. Mas mesmo se insistirem em tornar a conversa mais religiosa, lembrem-se dos trechos do livro sagrado em que se fala do não-julgamento ao próximo, do amor e do respeito ao outro e que Deus será quem irá julgar a cada um conforme seus atos.

Não digam, os mais puritanos, que todo esse alarde é em defesa das crianças. Assim como aconteceu com a nossa geração em relação a anterior, nossos filhos, sobrinhos, netos e afilhados saberão entender e lidar muito melhor com as diferenças. E não será porque a rede Globo desvirtua e destrói a família, mas sim porque eles terão uma capacidade superior de entendimento do mundo.

Para essa geração será imprescindível perceber que há outras formas de amar, constituir uma família e, principalmente, respeitar o outro. 


Marisa Monte - Beija Eu

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Precisa-se de paz

Só espero que este ano se inicie um novo ciclo pra mim, que se acabe a minha fase ruim, meu tempo fechado, meus dias de chuva... porque tudo parece estar fadado a um desgraçado fracasso, a um desmantelamento ao meu menor toque.
A mão de Midas às avessas que, no lugar do ouro, parece deixar os objetos tocados sem nenhum valor. Apodrece a carne, murcham as flores, trincam os vidros e afasta tudo. 

Num eterno medo de ter medo, temendo tudo que não cabe dentro das minhas angústias e imediatismos. O que não é pra agora não serve, não presta, inutiliza-se...

Sem frases de auto-ajuda, versículos bíblicos, trechos de canções ou ditos populares. Só quero saber para quando chega aquela encomendada paz?

Pedro Altério e Bruno Piazza - Paz Interior



sábado, 14 de junho de 2014

Sonhos e Sons

Num trânsito dos menos agradáveis, na volta pra casa, o som do carro tocava aleatoriamente as músicas do pendrive. De repente a escolha traz a música mais bonita (e mais triste, na minha opinião) do rock nacional.

De imediato pude ouvir minha mãe, como se estivesse sentada ao meu lado, dizendo: Essa música é linda! Com certeza ela cantaria toda, alto e rindo dos outros nos carros ao lado se assustando com suas gargalhadas. E como sempre, essas lembranças vêm trazer à tona tudo, o mundo, o tempo, as histórias...

A cabeça voltou alguns anos e de repente foi atrás, na noite anterior. Me encontrei com minha mãe nas ruas. Ela tão feliz, me segurando pelas mãos e levando pelas quadras, praças. Parecíamos estar na nossa cidade, mas ao mesmo tempo não conseguia reconhecer alguns dos espaços por onde andamos.

Eu não disse nada, não conseguia falar por conta do choro. Queria avisá-la, mas sabia que aquilo nos afastaria outra vez. Só chorava, enquanto ela fingia não ligar/ver a minha reação. Ah, que saudade daquele sorriso, daquelas gargalhadas. Haja choro!

Enquanto isso, o trânsito seguia se arrastando numa média de 10 km/h. Cada frase cantada remetia a cada lágrima sonhada. Mas as choradas agora eram reais, quentes, úmidas e salgadas. Tentava acompanhar o Renato, mas volta e meia engasgava em uma estrofe, ou no refrão.

Repeti a canção até chegar em casa, onde minha tia me trouxe outra lembrança (por conta dessa canção) numa praia perto de Salvador (BA), outro momento onde minha mãe também estava. De tarde, querendo descansar, chegando até a praia e vendo se o vento ainda estava forte...

Legião Urbana - Vento no Litoral