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domingo, 27 de julho de 2014

Remorsos

Desde a morte da minha mãe eu teimo em pensar que cada vez que escrevo/falo sobre o assunto já me basta para esgotá-lo. Tenho sempre a mesma impressão de que esvaziarei o que tanto me sufoca. O tema não se esgota. É recorrente nos textos e diariamente nas milhares de lembranças de sons, gostos, objetos, lembranças, piadas e, principalmente, naquilo que ela não está vivenciando.

De todos os parentes e amigos, eu acredito ser o que menos soube lidar com o fato. Nunca chorei tudo o que acredito ser o necessário para exorcizar muitos dos problemas surgidos com essa perda. Não bastando achar que foram poucas lágrimas, me questiono quanto minha atitude ser um demonstrativo de afeição. Minha cabeça quer medir amor conforme o sofrimento.

Vi  todos ao meu redor em prantos, mas eu não. Isso ainda me assusta, me corrói. Por quê e pra quê tanta coisa acumulada? Alguns me classificaram, na ocasião, como sendo muito forte. Só que esse "excesso de força", ainda hoje constante, têm causado cansaços, também constantes.

Não me privo de choros. Tenho até uma visão poética sobre eles, acho que são necessários quando os sentimentos estão excessivos. A válvula de escape. Só não sei "ativar" essa fonte. Buscar lembranças, cavá-las, para conseguir alguns tímidos choros têm sido o máximo alcançado.

Não bastando tudo o que já embola e bagunça a cabeça, sofro da síndrome de-uma-eterna-não-despedida. Em nosso último contato visual, saí me despedindo às pressas, correndo com minhas malas, voltei e nunca mais a vi. Fica sempre a pergunta de, por quê não me despedi como se fosse a última vez que nos veríamos? Porque antes das perdas sofremos de outra síndrome, a de-que-todos-que-amamos-não-morrem-de-repente. Uma ingênua descrença de que tudo pode acontecer, a qualquer momento, pro bem ou pro mal.

Sinto remorso, por uma não despedida. Por uma sensação de situação mal-resolvida. Penso em tantas coisas que poderiam ter sido ditas ou feitas. Penso que poderia ter havido um beijo, um abraço demorado, um gesto qualquer que selasse e marcasse como um adeus.

De tudo ficou o remorso eterno. A sensação de que, algumas vezes, voltarei pra casa e tudo estará como deixado. Existe uma descrença na situação, talvez por essa não-despedida. Mas qual preço pagaria por ter essa despedida? O mesmo que meu pai, irmão, tias pagaram ao vê-la morrer e tentarem desesperados "ressuscitá-la"?

Remorso, dúvida, incertezas... tudo se escrotizando, a cada dia, mais e mais aqui dentro. Mais uma semana começando, remoendo, revirando.

Simone e Zélia Duncan - Jura Secreta

sábado, 14 de junho de 2014

Sonhos e Sons

Num trânsito dos menos agradáveis, na volta pra casa, o som do carro tocava aleatoriamente as músicas do pendrive. De repente a escolha traz a música mais bonita (e mais triste, na minha opinião) do rock nacional.

De imediato pude ouvir minha mãe, como se estivesse sentada ao meu lado, dizendo: Essa música é linda! Com certeza ela cantaria toda, alto e rindo dos outros nos carros ao lado se assustando com suas gargalhadas. E como sempre, essas lembranças vêm trazer à tona tudo, o mundo, o tempo, as histórias...

A cabeça voltou alguns anos e de repente foi atrás, na noite anterior. Me encontrei com minha mãe nas ruas. Ela tão feliz, me segurando pelas mãos e levando pelas quadras, praças. Parecíamos estar na nossa cidade, mas ao mesmo tempo não conseguia reconhecer alguns dos espaços por onde andamos.

Eu não disse nada, não conseguia falar por conta do choro. Queria avisá-la, mas sabia que aquilo nos afastaria outra vez. Só chorava, enquanto ela fingia não ligar/ver a minha reação. Ah, que saudade daquele sorriso, daquelas gargalhadas. Haja choro!

Enquanto isso, o trânsito seguia se arrastando numa média de 10 km/h. Cada frase cantada remetia a cada lágrima sonhada. Mas as choradas agora eram reais, quentes, úmidas e salgadas. Tentava acompanhar o Renato, mas volta e meia engasgava em uma estrofe, ou no refrão.

Repeti a canção até chegar em casa, onde minha tia me trouxe outra lembrança (por conta dessa canção) numa praia perto de Salvador (BA), outro momento onde minha mãe também estava. De tarde, querendo descansar, chegando até a praia e vendo se o vento ainda estava forte...

Legião Urbana - Vento no Litoral

domingo, 20 de abril de 2014

Quase Choros

Ao lado da minha cama, ela repousa numa foto. Congelada no tempo, permanece ali do meu lado. Meus olhos decoram cada detalhe, cada ponto dentro da moldura. Enquanto me lembro saudoso como eram os dias ao seu lado. Desesperançoso com aqueles que ainda virão.

O choro fica por um eterno instante, esperando. À mercê da última gota. E esse quase chorar se intercala entre uma prece e uma tristeza. Como aquelas certezas que o tempo se encarrega de trazer, mesmo sabendo que ele nunca levou qualquer ausência pra longe daqui.

Queria poder chorar, mas choro não se vulgariza, não se banaliza. Esse choro entalado, me corrói. Se prende e vai encharcando a alma. Pesando, inchando e prendendo tudo por dentro. Talvez por isso os lamentos sejam tão repetitivos e rotineiros.

Choro não sai, lágrima não cai, grito não sobressai e me fica e dúvida se talvez seja por isso que a mãe não volte.

Vanessa da Mata - Por Causa de Você

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Telefonema aos Mortos

Semanas atrás, no meio da tarde, o telefone tocou e por um segundo pensei em não atender. Antes não tivesse. Do outro lado o homem perguntou pela minha mãe...

Não sei o que aconteceu. Gaguejei antes de avisá-lo, extremamente enfurecido, que ela havia falecido. Não sei se a informação foi indiferente a ele, ou se eu estava abalado demais e não me lembro se ele ao menos se desculpou. Continuou a conversa querendo saber se havia algum pensionista, fiquei ainda mais puto, encerrei a conversa e logo desliguei.

Nunca, desde sua partida, me senti tão desnorteado com essa situação. Não soube o que fazer, mesmo que alguns amigos sempre me digam que fui forte e reagi bem à perda dela, não soube o que fazer.

A sensação estranha foi como se a vida me tivesse ligado para me lembrar da morte. Uma "pegadinha" sem-graça rolou nesse dia. Abriu-se um novo corte, profundo. Acho que a coisa mais sutil e doce que consegui chamá-lo foi de FDP, daqueles ditos de boca cheia.

Não houve choro, de imediato. Revolta, talvez. Como alguém que recobra a consciência e se lembra de TUDO o que se perdeu "apenas" com a morte de uma pessoa. Como se as mágoas e tristezas, dos quase dois anos, ficassem entalados na garganta e de repente saíssem. Mas o choro, esse está por um triz, por uma saudade qualquer.

Engenheiros do Hawaii - Perfeita Simetria

domingo, 2 de março de 2014

(in)Sonia

A grande piada da noite chama-se insônia. A falta de sono, sim. Ela mesma, ou a falta dela. Aliás, chamar não chamei, mas tem quem vem sem nem ser bem quisto.

Mas minha mãe também faz falta, e não sei que nome dou pra isso. Seria também inSonia? A falta da Sonia. Quanto a esta, não adianta chamar, chorar, rezar ou procurar... Ficou só a essência diluída em lágrimas... foi-se.

E sempre me dizem que tem de ser assim. Têm coisas que se vão, são tão não mesmo quando precisamos do sim.

Sobram faltas nessa madrugada longa que vem por aí. Quer dizer, agora ela está bem mais curta. E não tô curtindo isso. Só me restam 2h e pouco de sono (ou quase isso) antes de me ajeitar pro rala...

Bora lá universo, conspira a meu favor. Apaga minha cabeça, minhas tristezas, meus cansaços, minhas ausências, minhas carências, minhas descrenças, minhas noias, minhas lombras, minhas lembranças, minhas mortes, meus cortes, minhas cicatrizes, meus desesperos, meus apelos, meus vazios, meus outros eus.

Amém. Agora posso tentar seguir.

Jota Quest - Só Hoje

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Dor, mente

Tudo veio ao mesmo tempo. Toda a vida tentando ser lembrada em um único momento. Saudosismo, arrependimento, saudade, tristeza, alegria... os sentimentos também vieram de uma vez. O peito acelerava, disparava como quem vê um fantasma do passado ali na frente. Mãos trêmulas, palidez...  a cabeça doeu, não sabia se por um efeito colateral ou como uma auto-defesa.


Liah Soares - Tempo Perdido




Enquanto sentia a dor, a cabeça tentava refazer a vida. Voltava no tempo e tentava mudar muitas coisas, coisas grandes demais para serem mudadas, coisas antigas demais, mas que transformaram os dias atuais. Quem ficou pra trás? Quem permaneceu ao seu lado? Quem encontrará amanhã? Quem reencontrará o caminho pra sua vida? Só se esquecera não pode fazer nada, nem mesmo mudar aquilo que foi feito, ou desfeito, lá atrás.

Não bastava fechar os olhos e reinventar seu mundo, cedo ou tarde é preciso encarar a realidade. Abrir os olhos e perceber o quanto uma escolha pode trilhar caminhos. Continua!, ouviu alguém gritar lá dentro. Olhou o horizonte e seguiu, tendo de fazer mais escolhas (talvez mais acertadas).

Maneva - Saudades do Tempo



quinta-feira, 27 de junho de 2013

Presente Ausente

Véspera de aniversário e muitas coisas ficaram na minha cabeça nas últimas semanas. Numa conversa sobre presentes que gostaria de receber, não fiz uma lista grande. Acho que sempre foi assim, nunca fiz grandes pedidos, nunca quis muita coisa, ou desejei muito.

Talvez por isso a vida sempre tenha sido generosa comigo e acho que seria muito da minha parte exigir ainda mais dela. Tudo que sempre precisei recebi nas medidas e momentos certos. Algumas vezes tive a impressão de que tive muito mais que o merecido.

Só que esse ano quero pedir um presente, algo que não poderei ter. Meu maior presente, hoje é ausente. É o desejo de acordar amanhã e sentir o abraço da minha mãe, ouvir seus votos de felicidade e sentindo seu cheiro saber que tudo permanece igual.

Não sei dizer como estou me sentindo nesse primeiro aniversário sem ela. Nas últimas semanas tenho estado mais recluso, extremamente impaciente, irritado e agoniado. Não quero comemorar, acho que uma parte em mim acredita nem mesmo ter o quê comemorar.

Eu ainda não consigo imaginar como será meu dia amanhã, só penso nas coisas que não terei. Mesmo sabendo que não receberei essa presença da minha mãe, sei que ela já me foi dada por 27 anos. Onde estiver, meu maior presente, só desejo que esteja comigo.

Marcelo Jeneci e Laura Laviere - Longe

sábado, 13 de abril de 2013

Esvaziando o pote...

Acendi um incenso, logo o cheiro me lembrou minha mãe. Daí então, outras lembranças começaram a se listar, como se tivesse feito uma busca na internet e milhões de coisas tivessem aparecido como resposta. Lembrei-me que hoje ela estaria feliz preparando-se pro aniversário da minha tia. Fazendo alguma coisa pra levar pro almoço, me chamando pra comprarmos algum presente e fazendo mil ligações pra minhas outras tias, meus primos e minha vó (que partiu há exato um mês).

A música no computador, me fez lembrar da nossa última conversa, por telefone. Para saber o quê comprar pra essa mesma tia que faz aniversário. Sentei na cama pra recuperar o fôlego e tentar achar uma resposta, um sussurro divino que me diga até quando vai doer tanto assim? Até agora só me vieram lágrimas.

Sei o quanto esses lamentos cansam os olhos de quem se dá ao trabalho de parar pra ler minhas postagens, mas algumas vezes é só escrevendo que consigo esvaziar o pote que se enche aqui dentro. Sei que nem todos entendem isso, e espero que tão cedo não saibam o que é essa dor. 

Mesmo crendo que exista algo além dessa vida, mesmo acreditando que ela permanece viva em algum bom lugar, isso ainda não é o suficiente para acalmar o coração. Mesmo comungando do pensamento de que o meu sofrimento também a traz sofrimentos, não consigo deixar de sofrer, acho que sofro em dobro.

Saudade é ignorante, desconhece crenças, datas e horários. Saudade não consegue entender o tempo. saudade é quando a pessoa ausente se torna extremamente presente e isso não é reconfortante. Apenas nos incomoda, nos atormenta, lembrando que essa pessoa só chegará aqui (quando muito) arrastada pelas lembranças que não preenchem.

Não há mais o contato físico do tato, do abraço apertado, da mão que virá procurar a sua pra segurar enquanto atravessa a rua e dos cabelos pra brincar de descabelar. Não dá mais pra ouvir a boca sempre pintada soltar aquelas gargalhadas, ou contar as piadas, dizer besterias, conselhos, broncas, pedidos, ou simplesmente cantarolar todas as músicas que você já ouviu desde seus primeiros anos de vida até hoje. 

Talvez ainda se sinta alguns cheiros, mas o cheiro bom, aquele que era dela... perdeu-se pra sempre. Jamais haverá outra comida que cheire, que traga os gostos temperados com música e sorrisos. E os olhos apenas se enganam com algum vídeo, ou mesmo foto sem sentimento algum. Apenas uma repetição de imagens artificiais que jamais deixarão de ser passado. Nenhum daqueles lugares terá sua presença novamente. E eu preciso do presente, do imediatismo. Me transformo em criança mimada que exige o agora.

E é só por isso que eu venho aqui desabafar e alugar os "olhos" de cada um que se dá ao trabalho de ler isso. Apenas porque tudo o que conheço da vida é com ela ao meu lado. Não escrevo esperando "curtidas", comentários com declarações, ou mesmo dó e indiferença, só quero realmente esvaziar o peito e desentupir o canal lacrimal compartilhando com cada um o que nem eu sei explicar.

Hoje não quero que venham me dizer que não devo chorar, ou que ela permanece viva dentro de mim (já fui tolo o suficiente de repetir isso para alguns amigos acreditando que resolveria o problema). Quero mais é que se foda toda essa ladainha, eu a quero aqui comigo e sei que isso não vai acontecer e se ninguém poder me dar isso, não me digam mais nada, nem mesmo o que devo ou não fazer.  Rezem, meditem, me mandem bons pensamentos, mas por favor não digam que eu não posso sentir falta de 27 anos repletos de tudo isso.

Só quem esteve ao seu lado, por pelo menos um dia, entende o silêncio e o vazio que ficou.

(E todas as perdas que vieram de lá pra cá também fazem questão de estar por aqui. Minha mãe, minha vó e até mesmo eu, que me perdi de mim...)


Leandro Léo - Poema

quarta-feira, 20 de março de 2013

Lembranças de Setenta Agostos

Brasília, 31 de Agosto de 2012

Ontem, em uma rápida viagem com minha mãe e minha vó, vivi um daqueles momentos que a vida nos proporciona para que jamais nos esqueçamos. Apesar de fragilizada e acreditar estar debilitada, pude curar os problemas de minha vó apenas com uma alta dose de atenção e longas conversas. 
  
Sem tantas dores, tremores nas mãos, reclamações ou qualquer uma das queixas tão comuns nos últimos tempos, a vi como não via há anos. Seus olhos estavam tão vivos e reluzentes que lembrei-me da mulher que conheci anos atrás. Lembrou-se de toda a sua vida, da infância, dos irmãos, dos sobrinhos espalhados por todos os cantos do Brasil e de outras histórias familiares.
  
A partir de um retrato, lembrou-se do dia em que conheceu meu avô em um baile, ainda que ele não dançasse. Por um instante as mágoas sumiram e detalhou a beleza e juventude do meu velho. Mas ela reforçou também seus atributos em seu belo corpo e a vaidade de uma jovem adolescente. As histórias foram sendo contadas pouco a pouco e quando menos vimos haviam se passado sete décadas.
  
No caminho, imaginou-se dona de uma bela fazenda à beira da estrada com um lago rodeado por palmeiras. Entrando na brincadeira, pedi que ela me desse já que além de neto sou seu afilhado. Sorrindo, ela concordou em me dar o imóvel que possuía em seus sonhos. Como era bom ver que ela tinha retomado os sonhos. Pensou na vida, caso tudo tivesse sido diferente. Pensou também no quanto poderia ter deixado mais para os seus, mas no fim contentou-se com tudo o que pôde fazer.
  
Sorriu, gargalhou, se divertiu, se irritou com os caminhões nos fechando na estrada e também reclamou um pouco. Se emocionou com suas roseiras no jardim, todas floridas como se estivessem competindo com os hibiscos. Lançou beijos para as flores e as tocou com delicadeza, retribuindo carinhosamente por enfeitarem seu quintal. Havia mais vida naquelas flores, naquela estrada, naquele dia, naquela alma.

(Descanse em paz vó, madrinha, amiga...)


Maria Gadú - Oração ao Tempo 

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

2012, o ano do amor

De 2012 só me recordo do amor. Tive ao meu lado um grande amor, principalmente quando perdi meu amor maior (minha mãe). Por isso só posso falar que esse foi um ano de amor. Amor em todos os tons, sons, gostos, texturas, aromas, calores, tamanhos e intensidades.

Mas se perdi minha mãe, como pode ter sido um ano de amor? Por todo o amor que recebi de volta. De quem esteve ao meu lado todos os dias, dando amor, compartilhando os choros e o colo aconchegante e seguro pra me refugiar; dos meus amigos que me consolaram e ajudaram; da minha família e principalmente do meu pai ao aprendermos a nos amar ainda mais. Pode parecer ridículo, mas também recebi de minha mãe. Sua partida deixou um universo de amor dentro de todos os que a amavam.

Termino o ano com uma lista de tristezas e perdas, mas outra de alegrias e realizações também. Nada irá substituir as ausências (em especial da minha mãe), mas devemos viver um dia por vez. Amanhã nascerá outro Sol, outro dia, outro mês, outro ano, outra chance de ser feliz mais uma vez.

Ultimamente não tenho estado na minha melhor condição mental e espiritual, por isso não vou me alongar no último post do ano. Não tenho muitas expectativas para 2013. Espero que seja um ano de saúde e paz. Que tenhamos coragem e força pra enfrentar o que está por vir e fé para não desistir.

Feliz 2013!

Maria Bethânia - Tocando em Frente

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

E a vida continua...

Véspera de Natal, mas não será tão fácil e alegre comemorar por aqui. O dia amanhece dando sinais de que será triste e arrastado. Se fosse um outro feriado santo talvez seria uma sexta-feira da paixão. Mais do que presente em sua ausência, minha mãe tem estado em sonhos comigo. Não que sonhar seja ruim, o problema sempre esteve em acordar.

E despertar em datas assim, tão familiares, piora tudo e fica fimpossível não se lembrar dela. A imagino na cozinha preparando pratos para a ceia, ligando para as minhas tias, para a minha avó e me acordando para irmos comprar presentes e a batata palha, que sempre faltava.
Mas hoje não será assim... e preciso me acostumar. 


Não bastando minha dor, a ceia de hoje também será de luto para meus primos. Três meses antes da perda da minha mãe, eles perderam seu pai. Seremos quatro órfãos (eu, meu irmão e meus dois primos), dois viúvos (meu pai e minha tia) e meus avós chorando a perda de uma nora e um genro. Não teríamos ceia, mas apesar dos pesares celebraremos pelos que ainda estão aqui. Uma difícil e insuportável lição da vida, ela continua e não para por caprichos ou lutos de quem quer que seja.

Quero que cada um que ler isso entenda o dia de hoje como uma data para agradecer e se comemorar a vida, celebrar a família, os amores e principalmente se alegrar pela presença de cada um dos seus ao nosso lado. A mãe coruja, o tio chato, a cunhada bonita, o sobrinho levado, a namorada ciumenta, o irmão preguiçoso, a tia nojenta, o primo engraçado, o noivo esquecido, a avó religiosa, o avô animado...

A vida é tão curta. Leva quem amamos e nos deixa com a triste sensação de que devíamos e podíamos ter feito muito mais. Ter amado, vivido, dito uma centena de coisas, ter feito declarações de amor, ter deixado de lado as discussões e ter perdoado. Minha mãe se foi, mas o amor ficou aqui nos enfeites da casa, na saudade doída e nas boas lembranças que por vezes nos faz chorar, nos faz sorrir e esquecer que temos uma vida pela frente.


Não digo que seja fácil. A cada dia parece que piora, que a dor aumenta. Existe dentro de mim uma louca certeza de que minha mãe vai chegar de viagem a qualquer momento, mas infelizmente não vai ser assim. Se alguém também vive um luto, lembre-se que, mesmo nas tristezas e nos sofrimentos, não somos desamparados nem esquecidos por Deus. Por mais que algumas vezes a gente pense que Ele nos abandonou.

Feliz Natal!
Muita paz e luz pra todos nós.


Mart'nália - Benditas

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Adeus - II

Meu corpo estava cansado ao extremo, emocional e psicologicamente pela perda de minha mãe e fisicamente pela noite em claro no aeroporto do Rio Grande do Norte e as pouco mais de duas horas de viagem. Um banho longo, um suco, uma fruta e estava "pronto" para seguir para o cemitério.

Não sei o que havia naquele dia. Se Sol, se chuva... de alguma forma cheguei lá e apenas recebi abraços e palavras de inúmeros amigos e familiares.Tantos rostos e vozes conhecidas e queridas apareceram naquele e nos dias seguintes. Por mais triste que fossem aqueles momentos, o alento daqueles que nos querem bem sempre será um conforto ao coração.

Amigos de longa data de minha mãe também vieram. Estiveram ali para se despedir. Não a vi, quis lembrar-me da última vez em que me despedi e viajei. Minha despedida foi 11 dias antes, mas dias depois do velório nada daquilo parecia ser verdade. Ainda tenho a certeza, mesmo hoje, que daqui dias ou horas ela voltará de alguma viagem.

Uma vizinha e amiga de minha mãe prestou ainda uma última homenagem. Durante o sepultamento puxou uma canção que ouvi algumas dezenas de vezes minha mãe cantarolar. Todos acompanharam, choraram e entenderam que aquilo que cantavam narrava a vida daquela de quem se despediam. Uma vida vivida sem vergonha de ser quem se era, de ser feliz...

Gonzaguinha - O que é, o que é

Eu fico
Com a pureza
Da resposta das crianças
É a vida, é bonita
E é bonita...

Viver!
E não ter a vergonha
De ser feliz
Cantar e cantar e cantar
A beleza de ser
Um eterno aprendiz...


Ah meu Deus!
Eu sei, eu sei
Que a vida devia ser
Bem melhor e será
Mas isso não impede
Que eu repita
É bonita, é bonita
E é bonita...

E a vida!
E a vida o que é?
Diga lá, meu irmão
Ela é a batida
De um coração
Ela é uma doce ilusão

E a vida
Ela é maravilha
Ou é sofrimento?
Ela é alegria
Ou lamento?
O que é? O que é?
Meu irmão...

Há quem fale
Que a vida da gente
É um nada no mundo
É uma gota, é um tempo
Que nem dá um segundo...

Há quem fale
Que é um divino
Mistério profundo
É o sopro do criador
Numa atitude repleta de amor...

Você diz que é luta e prazer
Ele diz que a vida é viver
Ela diz que melhor é morrer
Pois amada não é
E o verbo é sofrer...

Eu só sei que confio na moça
E na moça eu ponho a força da fé
Somos nós que fazemos a vida
Como der, ou puder, ou quiser...

Sempre desejada
Por mais que esteja errada
Ninguém quer a morte
Só saúde e sorte...

E a pergunta roda
E a cabeça agita
Eu fico com a pureza
Da resposta das crianças
É a vida, é bonita
E é bonita...

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Adeus - I

Enquanto na TV homenagens eram prestadas a uma falecida apresentadora, cantora e atriz, eu já me encontrava triste sem saber ao menos o motivo. Coloquei minha mala sobre a cama e a fiz para voltar. Mesmo que ainda faltasse tanto tempo para retornar, quis (sem saber o motivo) deixar tudo pronto para minha volta.

Na rua, comprei a lembrança que faltava. Um quadro retratando a santa ceia, algo que minha mãe sonhara por tantos meses. Enfim, achei um que lhe agradaria. Peguei o celular para avisá-la, mas hesitei no último segundo. Que tal fazer uma surpresa? Desliguei e fui dar um passeio noturno à beira-mar, um último brinde e depois descansar. Ainda assim algo parecia estranho desde o sábado pela manhã.

O telefone toca, minha mãe!? Pelo adiantado da hora achei estranho, mas o que poderia ter acontecido? Com certeza ela me perguntaria sobre algo relativo à viagem e se alguém iria me buscar do aeroporto. Atendi brincando e perguntando o quê ela queria. Do outro lado meu irmão aos prantos me pergunta onde estou, me pede pra ser forte e avisa que nossa mãe havia desencarnado...

Não me lembro bem o que aconteceu depois disso. Com muita dificuldade e passado algum tempo cheguei ao hotel aos prantos, sentei na cama e rezei pela alma da minha mãe. Minutos depois enviei duas ou três mensagens e recebi dezenas de telefonemas e mensagens.

Outra vez minha memória falha e agora já estou a caminho do aeroporto. Perto da meia noite alguém me liga, mais choro, mais inércia, mais nada. Uma noite sentado, sob um ar condicionado me congelando e eu tremendo de medo. Não queria voltar, mas também sabia que fazia parte da vida enterrar meus mortos.

Já de volta à Brasília, meus primos me esperavam. Choramos, nos abraçamos e eu ainda parecia estar dormindo. Esperava acordar ou ver ao chegar sorrindo e me dizer que tudo não passou de uma brincadeira. Até agora estou esperando.

Em casa outra sessão de choros a cada novo abraço e desejo de me reconfortar. Me vi tentando reconfortar tantos, a começar pelos meus avós e pelo meu irmão deitado em minha cama, dopado pelos remédios de tarja preta e como se quisesse meu perdão, jurou ter feito de tudo para salvá-la.

A casa revirada e suja descrevia toda a tragédia ocorrida ali horas atrás. Talvez depois de tudo isso, meu pai tenha descreditado ainda mais que Deus possa existir. Não que ele precisasse de novos argumentos, isso ele têm de sobra, mas talvez agora ele tivesse motivos reais para descrer. Ao me ver, veio emocionado me abraçar. Não sei ao certo se foi eu quem o acalmou, ou se ele me deixou nervoso.

Não houveram despedidas, tudo repentino como ela queria que fosse sua partida. Mas tenho a certeza que nem mesmo ela queria que fosse tão doloroso para todos nós. Agora seríamos apenas nós dois (eu e meu pai) e toda falta que minha mãe deixou. Terceiro elemento que se faz muito mais presente e preenchedor de espaços dentro dos nossos dias daqui por diante.

Alcione e Maria Bethânia - Sem Mais Adeus