O amor deixa muito a desejar
(Arnaldo Jabor)
A Rita Lee fez uma música com a letra tirada de um artigo que escrevi, sobre amor e sexo.
A música é linda, estou emocionado, não mereço tão subida honra, quem sou eu, quase enxuguei uma furtiva lágrima com minha "gélida manina" por estar num disco, girando na vitrola sem parar com Rita, aquela hippie florida com consciência crítica, aquela hippie paródica, aquela mulher divinamente dividida, de noiva mutante ou de cartola e cabelo vermelho que, em 67, acabou com a caretice de Sampa e de suas lindas "minas" pálidas.
A música veio mesmo a calhar, pois ando com uma fome de arte, ando com saudade da beleza, ando com saudade de tudo, saudade de alguma delicadeza, paz, pois já não agüento mais ser apenas uma esponja absorvendo e comentando os bodes pretos que os políticos produzem no Brasil e o Bush lá fora. Ando meio desesperançado, mas essa canção de Rita trouxe de volta a minha mais antiga lembrança de amor. Isso mesmo: a canção me trouxe uma cena que, há mais de 50 anos, me volta sempre. Sempre achei que esse primeiro momento foi tão tênue, tão fugaz que não merecia narração. Mas, vou tentar.
Eu devia ter uns 6 anos, no máximo. Foi meu primeiro dia de aula no colégio, lá no Meier, onde minha mãe me levou, pela Rua 24 de Maio, coberta de folhas de mangueira que o vento derrubava. Fiquei sozinho, desamparado, sem pai nem mãe no colégio desconhecido. No pátio do recreio, crianças corriam. Uma bola de borracha voou em minha direção e bateu em meu peito. Olhei e vi uma menina morena, de tranças, com olhos negros, bem perto, me pedindo a bola e, nesse segundo, eu me apaixonei. Lembro-me de que seu queixo tinha um pequeno machucado, como um arranhão com mercúrio-cromo, lembro-me que ela tinha um nariz arrebitado, insolente e que, num lampejo, eu senti um tremor desconhecido, logo interrompido pelo jogo, pela bola que eu devolvi, pelos gritos e correria do recreio. Ela deve ter me olhado no fundo dos olhos por uns três segundos mas, até hoje, eu me lembro exatamente de sua expressão afogueada e vi que ela sentira também algum sinal no corpo, alguma informação do seu destino sexual de fêmea, alguma manifestação da matéria, alguma mensagem do DNA. Recordando minha impressão de menino, tenho certeza de que nossos olhos viram a mesma coisa, um no outro. Senti que eu fazia parte de um magnetismo da natureza que me envolvia, que envolvia a menina, que alguma coisa vibrava entre nós e senti que eu tinha um destino ligado àquele tipo de ser, gente que usava trança, que ria com dentes brancos e lábios vermelhos, que era diferente de mim e entendi vagamente que, sem aquela diferença, eu não me completaria. Ela voltou correndo para o jogo, vi suas pernas correndo e ela se virando com uma última olhada.
Misteriosamente, nunca mais a encontrei naquela escola. Lembro-me que me lembrei dela quando vi aquele filme Love Story, não pelo medíocre filme, mas pelo rosto de Ali McGraw, que era exatamente o rosto que vivia na minha memória. Recordo também, com estranheza, que meu sentimento infantil foi de "impossibilidade"; aquele rosto me pareceu maravilhoso e impossível de ser atingido inteiramente, foi um instante mágico ao mesmo tempo de descoberta e de perda. Escrevendo agora, percebo que aquela sensação de profundo "sentido" que tive aos 6 anos pode ter marcado minha maneira de ser e de amar pelos tempos que viriam. Senti a presença de algo belíssimo e inapreensível que, hoje, velho de guerra, arrisco dizer que talvez seja essa a marca do amor: ser impossível. Calma, pessoal, claro que o amor existe, nem eu sou um masoquista de livro, mas a marca do sublime, o momento em que o impossível parece possível, quando o impalpável fica compreensível, esse instante se repetiu no futuro por minha vida, levando-me para um trem-fantasma de alegrias e dores.
Amar é parecido com sofrer - Luís Melodia escreveu, não foi? Machado de Assis toca nisso na súbita consciência do amor entre Bentinho e Capitu:
"Todo eu era olhos e coração, um coração que desta vez ia sair, com certeza, pela boca."
Isso: felicidade e medo, a sensação de tocar por instantes um mistério sempre movente, como um fotograma que pára por um instante e logo se move na continuação do filme. Sempre senti isso em cada visão de mulheres que amei: um rosto se erguendo da areia da praia, uma mulher fingindo não me ver, mas vendo-me de costas num escritório do Rio... São momentos em que a "máquina da vida" parece se explicar, como se fosse uma lembrança do futuro, como se eu me lembrasse ali, do que iria viver.
Esses frêmitos de amor acontecem quando o "eu" cessa, por brevíssimos instantes, e deixamos o outro ser o que é em sua total solidão. Vemos um gesto frágil, um cabelo molhado, um rosto dormindo, e isso desperta em nós uma espécie de "compaixão" pelo nosso próprio desamparo, entrevisto no outro.
A cultura americana está criando um "desencantamento" insuportável na vida social. Vejam a arte tratada como algo desnecessário, sem lugar, vejam as mulheres nuas amontoadas na internet. Andamos com fome de beleza em tudo, na vida, na política, no sexo; por isso, o amor é uma ilusão sem a qual não podemos viver. Todas essas tênues considerações, essas lembranças de lembranças, essa tentativa de capturar lampejos tão antigos, com risco de ser piegas, tudo isso me veio à cabeça pela emoção de me ver subitamente numa música, parceiro de Rita Lee, "lovely Rita", a mais completa tradução de São Paulo, essa cidade cheia de famintos de amor.
Rita Lee - Amor e sexo
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quinta-feira, 24 de junho de 2010
quarta-feira, 9 de junho de 2010
Sexo, drogas e Legião
A tríade, sexo drogas e rock'n roll é uma antiga combinação. Pesada para alguns, mas trivial para uma grande maioria. Atualmente a trilha não é necessariamente o bom e velho som das guitarras. Outras vertentes do ritmo, ou primas e parentes distantes (de estilos totalmente diferentes) substituem o rock.
Mas pra mim a combinação original ainda é a melhor opção. Mais viciante e instigante. Que beleza terminar tudo e sentir-se aliviado. A sensação de que você pôs pra fora algo que incomodava. Acho que isso dá um duplo, ou até triplo sentido pra coisa. Tudo bem, a intenção é mesmo essa.
Sexo, pra relaxar. Pra saciar a necessidade, o instinto animal. Quando o faro capta a oportunidade, logo o organismo se prepara, se predispõe para o coito, o ato final. Sim, libido em altas dosagens. Freud já explicou o ser humano e suas motivações por conta da libido, comigo não funciona diferente não. Sexo é pra se ter prazer, pra ser sacana e sujo. Sexo com pudor e com frescuras... é melhor se trancar no banheiro e resolver sozinho.
Drogas, pra imaginar. Pra cabeça se distrair do mundo real. Às vezes é foda o peso do mundo e o stress do dia-a-dia. Mas eu prefiro o envolvimento com drogas lícitas. Elas já conseguem dar conta do serviço e não preciso "viajar" tanto pra me sentir bem. Tudo devidamente ingerido em bons goles gelados. Álcool é bom que também atiça. Mexe com a libido e deixa as coisas ainda melhores.
Legião, pra pensar. Pra lembrar de tudo e pensar na vida feito um condenado que não tem mais nada pra fazer do que pensar, pensar e pensar. As drogas, ingeridas antes e durante, controlam isso. Não deixam a realidade ser demais e o som da Legião não deixa que me distraia tanto. Lembrar dos erros, dos acertos, momentos bons e ruins e pensar que o futuro pode ser ainda melhor. Ah!, quantas lembranças vividas a cada estrofe cantada pelo Renato. Acho que fomos amigos e ele sabia tudo o que se passava na minha vida (na minha e na de tantos outros fãs).
Mas a noite de ontem foi ótima. A combinação perfeita e ainda me inspirei para páginas e mais páginas nos meus cadernos. Quando a cabeça se acomodou no travesseiro, o sorriso cresceu no rosto e os olhos se fecharam tranquilos. Boa noite vini. Boa noite!
Legião Urbana - Só por hoje
Mas pra mim a combinação original ainda é a melhor opção. Mais viciante e instigante. Que beleza terminar tudo e sentir-se aliviado. A sensação de que você pôs pra fora algo que incomodava. Acho que isso dá um duplo, ou até triplo sentido pra coisa. Tudo bem, a intenção é mesmo essa.
Sexo, pra relaxar. Pra saciar a necessidade, o instinto animal. Quando o faro capta a oportunidade, logo o organismo se prepara, se predispõe para o coito, o ato final. Sim, libido em altas dosagens. Freud já explicou o ser humano e suas motivações por conta da libido, comigo não funciona diferente não. Sexo é pra se ter prazer, pra ser sacana e sujo. Sexo com pudor e com frescuras... é melhor se trancar no banheiro e resolver sozinho.
Drogas, pra imaginar. Pra cabeça se distrair do mundo real. Às vezes é foda o peso do mundo e o stress do dia-a-dia. Mas eu prefiro o envolvimento com drogas lícitas. Elas já conseguem dar conta do serviço e não preciso "viajar" tanto pra me sentir bem. Tudo devidamente ingerido em bons goles gelados. Álcool é bom que também atiça. Mexe com a libido e deixa as coisas ainda melhores.
Legião, pra pensar. Pra lembrar de tudo e pensar na vida feito um condenado que não tem mais nada pra fazer do que pensar, pensar e pensar. As drogas, ingeridas antes e durante, controlam isso. Não deixam a realidade ser demais e o som da Legião não deixa que me distraia tanto. Lembrar dos erros, dos acertos, momentos bons e ruins e pensar que o futuro pode ser ainda melhor. Ah!, quantas lembranças vividas a cada estrofe cantada pelo Renato. Acho que fomos amigos e ele sabia tudo o que se passava na minha vida (na minha e na de tantos outros fãs).
Mas a noite de ontem foi ótima. A combinação perfeita e ainda me inspirei para páginas e mais páginas nos meus cadernos. Quando a cabeça se acomodou no travesseiro, o sorriso cresceu no rosto e os olhos se fecharam tranquilos. Boa noite vini. Boa noite!
Legião Urbana - Só por hoje
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