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terça-feira, 25 de maio de 2010

Finda vida

A cabeça encostada na parede e o corpo adormecido de mal jeito na pequena cadeira ao lado do leito não fazia daquelas noites as melhores. Na maca seu pai, doente, com sua saúde se agravando a cada dia. Não era fácil, não eram noites, nem dias fáceis. No meio de tanto sofrimento, um pequeno pensamento veio e foi logo repreendido.

Mas tinha razão, se o homem forte que ele conhecera como sendo seu pai morresse naquele instante, na velocidade em que seu pensamento funcionara, seria mais fácil. Não era egoísmo pensar nisso, afinal a "não-vida" seria um descanço (seja eterno ou não). Após tanto sofrimento, tantas noites em que se acreditara que havia chegado o momento, o homem resistia em sua luta. As mãos grandes e fortes deviam estar prendendo ele à vida.

O jovem precisava descansar um pouco. Devia ir pra casa e dormir para depois voltar ao seu turno no hospital. No caminho pensou no que havia pensado. Pensou em não pensar mais nisso. O que não conseguia deixar de pensar era no pai e em tudo que estava acontecendo. A namorada não se importava muito, achava bobagem, achava que era muito alarde em cima de pouca coisa. Justificável para quem nunca teve uma boa relação com o próprio pai, por que entenderia uma dor sentida para um pai? Pai é pai, fato! Ela concluiu com toda a razão que jamais tivera mas acreditava ter.

Em casa ele desabou na cama. Sonolento, não conseguia dormir graças à cabeça trabalhando o tempo inteiro. Tomou um banho e relaxou um pouco, mas ainda estava tenso o suficiente para pensar em tudo e tentava se distrair com a água escorrendo pelo seu corpo. Percebeu que sua vida também ficou reclusa naquele quarto de hospital nos últimos dias. Dias, semanas... não havia mais noção de tempo. Não havia fome, mal havia sono. A vida virou um filme, como muitos dizem, e foi projetado em sua cabeça. Tudo passou na velocidade suficiente para que nada fosse esquecido ou deixado de lado.

O telefone tocou como um despertador. Ele sabia bem o que viria após o "Alô". Um filho enterrar o pai, isso não é justo, falou algum velho. Alguém que ele não soube identificar ao certo quem seria. No cemitério ele teve vagas lembranças de tudo o que aconteceu. Não se lembra direito de voltar ao hospital, de ir ao enterro ou de qualquer outra coisa feita depois daquele telefonema. Só se lembrava da morte do pai. Só queria não ter visto o seu pensamento como a melhor opção para tudo aquilo.

Este ano não haveria queima de fogos, nem contagem regressiva de fim de ano. Estava exausto. A cabeça doía, se agitava de um jeito que nunca esteve. O telefonema agora era da namorada, comemorando algo em algum lugar, alguma festa qualquer, e pedindo que ele fosse buscá-la. Ela já havia se divertido o suficiente. Estava "morta", disse rindo a uma amiga enquanto esperava por ele.

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